Redação escrita pelo meu pai, quando adolescente,
para aula de Filosofia – Colégio Marista
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Sem Titulo
Morri a semana passada, e o que é pior, é que por algumas faltas condenaram-me a
viver 300 anos com estes homens e neste lugar.
É um grande casarão, cheio de pilares redondos e com um sítio em redor. Aqui se come a hora que quer tem-se de tudo, mas saibam… Não poderiam ter-me dado castigo maior. Não posso falar.
Se falo a um, ele me pergunta:
– Quantos são os elementos que compõem o mundo?
Se vou jantar, meu vizinho pede-me uma opinião sobre a essência do ser.
Se estou à passear, aproxima-se um grupo discutindo, e um deles diz
– Que acha das penas eternas?
Como eu digo que não sei do que se trata, ele replica:
– Bem não interessa. Mais saibam que na terra há um rapaz que está estudando o problema e em breve o resolverá.
Só falam de nomes que eu não conheço. E outra coisa, só tem prestígio aqui quem é grego; Eu não sei porque, mas basta aparecer um tipo vestido numas coisas parecidas com saia de mulher pra todo mundo ir atrás ouvir as besteiras que ele diz.
Só fiz uma amizade; e foi com um destes gregos. É um velho alto barbado e até colega, que fala da terra e tudo quer saber. Apenas não tolero seu nome, esses gregos tem cada uma, Platão, se tirar o P fica…
Esse povo daqui é todo doido, quando passeio com o seu Platão, ele me diz os nomes e eu olho as manias.
Tem um velho de turbante, chamado Omar Kayan, que gosta de sentar-se num tamborete cercado de vinho por todos os lados.
O outro doido, seu Arquimedes, passa o dia todinho tomando banho pra achar o que eu não sei o quê.
Seu Nietzsche leva horas lendo gibi e só lê gibi do Super-Homem.
Tem um padre e um árabe que onde estão, estão discutindo. Como eles discutem até na refeição e o padre é muito barrigudo, tem uma meia luz na mesa pra ele colocar a pança.
São seu Averróis e o padre Tomaz de Aquino.
Tem também uma escola e o seu Karl Marx é o professor. Ele dá muito bolo num aluno muito burro que tem por aqui. Sabem que é? É o Stalin, mas como o povo é besta! Ele ensinava tanto na terra e aqui é tão burro.
Seu Spinoza, que é muito chato, passa o dia lustrando uns vidros redondos que seu Galileu vai comprar.
Um velho murchinho, seu Voltaire passa o dia gritando:
– Quero a marquesa!
Eu tive pena e falei-lhe:
– Vou procurar a cadelinha pro senhor
Ele zangou-se e disse:
– Uma cadela! Ignorante, é a marquesa de Châtelet. Bem se vê que só mandam imbecis prá cá.
Seu Platão aqui tem muito prestígio, mas o chefe é seu Aristóteles que só vive
estudando.
Um velhinho, seu Sócrates, vive a dizer:
– Eu não devia ter bebido, eles não o mereciam!
Que besteira. Quem se vicia na cachaça é porque quer. Eu, nunca bebi por desgosto,
esse bebeu e fica reclamando.
Um outro seu “Jansenius”, quando soube que eu era brasileiro, veio saber seu eu conhecia
o jovem que ia resolver sobre o “livre arbítrio e o determinismo”
Como eu dissesse que os árbitros que conhecia eram:
Sherlocke, Vicente Lobão Laurito e determinante as que Dr. Laurindo
me ensina, chamou-me de burro e mandou-me estudar uma física que começa por meta.
Tem um aqui, que passa o dia comendo, parece que engoliu um canário e pegou fome canina, é seu Epicuro.
Por outro lado seu Zenão não come mais do que farinha seca.
Pra terminar mulher aqui não entra, perguntei a seu Platão e ele me disse que antigamente era permitido;
mas como só faziam confusão, seu Aristóteles mandou-as embora.
Vou ver se arranjo um pistolão pra sair daqui; Com oito dias já estou cheio quanto mais com 300 anos.
(Ruy Barbosa de Oliveira)